sábado, 5 de março de 2011

O Dionísio e o Vinho

- Pai, o que você anda ensinando pro Dionísio?
- Nada demais! Somente coisas boas... Porque?
- É que eu e o Felisberto fomos chamados na escola. Só veio escrito no diário que ele desafiou a professora na frente de todos os colegas.
- Eu não tenho nada com isso!
- Tem sim... Ele disse que só contou as coisas que você ensina pra ele.


Eu estava com a consciência super tranquila. Verdadeiramente eu tento transferir pro Dino, meu primeiro neto, agora com 8 anos, as coisas que aprendi quando menino, quando tinha a idade que ele tem agora. Só isso!
Ficou assim, o dito pelo Benedito... Até o dia da reunião!


- Meus alunos... Bom dia! Disse a professora ao entrar na sala de aula logo no início daquela manhã.
- Bom dia. Responderam os alunos.
- Hoje vamos falar sobre os males do álcool... O que vocês sabem sobre isso?
E a professora começa a interagir com a classe, puxando a participação de todos para potencializar o aprendizado da criançada... Até aí tudo ia muito bem.
O assunto passou pelo vício, pela dependência química, pela desagregação das famílias quando o pai trilha o caminho maléfico do álcool...
A desgraça se deu mesmo quando a professora começou dar exemplos das bebidas que contém o álcool na sua composição.


- A cerveja contém álcool e deve ser consumida somente por adultos e moderadamente. As bebidas mais fortes, como uísque, aguardente e outras têm ainda maior teor alcoólico e merecem ainda mais cautela.... discorria a professora brilhantemente.


Tudo ia muito bem até que chegou no vinho... Aí ferrou de vez!


- O suco de uvas, por exemplo, é inofensivo e faz muito bem para a saúde. Entretanto no processo de fermentação o suco de uva se transforma em vinho...
- Professora! Interrompeu o Dino levantando uma das mãos.
- Pois não, Dino. Você gosta de suco de uvas?
- Gosto. E gosto muito de vinho também! Participou o Dino em claro e bom tom.
Muito surpresa, a professora perguntou:
- Como assim, Dino? Você gosta de vinho?
- Gosto muito, primeiro observo o visual, a coloração na taça, depois levo no nariz, sinto o aroma. Só depois disso é que se pode provar. Coloco na boca,  seguro um instante, faço o vinho passear por todos os cantos da boca, fecho os olhos e vou percebendo e memorizando todas as sensações! Depois engulo, puxo o ar e solto devagar para perceber bem o olfato. Espero alguns instantes sem falar e vou percebendo quanto tempo dura o sabor na minha boca! Na ponta da língua a gente percebe...
Dino! Interrompeu bruscamente a professora num tom forte. Onde você toma vinho?
- Em casa, professora. É uma delícia!
- Que absurdo, Dino. Você deve estar fazendo alguma confusão. Crianças não tomam vinho!
- Eu tomo sempre! Apartou Dino, desafiando a professora.
- E com quem você toma vinho? Quem oferece vinho pra você?
- Meu avô.


Foi nesse exato momento que aconteceram duas coisas importantes:
Dino foi "convidado" a fazer um relato na diretoria da escola sobre suas eno-experiências e eu tive as mãos e pés perfurados por cravos ao ser fixado numa daquelas cruzes de madeira e exposto ao sol por alguns dias.
As perfurações já cicatrizaram e o pobre Dino teve sua iniciação interrompida temporariamente no eno-maravilhoso mundo dos vinhos.


Você e as professoras do colégio devem estar pensando que sou um louco e inconsequente avô, mas na verdade, sou só um pouquinho. A professora esqueceu de perguntar e o Dino esqueceu de contar a quantidade de vinho que ele provava.
No jantar, quando uma nova garrafa era aberta, eu aproveitava para fazer a aproximação eno-responsável entre o vinho e o Dino, num processo educativo, assim como fizeram comigo desde a mais tenra idade. Naquela época não havia essa oferta maluca de todos os tipos de bebidas gaseificadas que estão, junto com outros hábitos pouco recomendáveis, deixando obesa boa parte da população de muitos países. E os brasileiros não estão fora dessa. Até água com o nome de H2OHHH as pessoas compram!!!
Me lembro que quando era menino o refrigerante dos finais de semana das crianças era composto por "um dedinho" (deitado, ouviu bem?!) do vinho tinto que os adultos estavam bebendo, num copo do tipo americano, completado com água e açúcar.
Que delícia!!!
Que saudades!!!
... e nem porisso me transformei num alcoólatra!
Saúde e moderação a todos!


Texto do meu amigo de infância, Mario Sbattuto, o saudoso Sbatto, em homenagem ao seu neto imaginário Dionísio Sbattuto, o Dino.
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